O Brasil que eu quero

O Brasil que nós queremos obviamente não é o que a mídia quer. Quanto mais ignorante somos, mais manipulável nos tornamos. E quanto mais manipulável, mais a mídia tem poder e portanto mais dinheiro.

É uma matemática bem simples.

Há alguns meses a Globo criou sabe-se lá porque a mistificação do Casagrande.  Eu não o conheço, não tenho nada contra, só ouço falar bem, inclusive. Deve ser uma pessoa boa.

Mas é um clichê cada vez mais na moda que devemos exaltar o cara que parou de errar e não o que nem errou. É um clamor pela segunda chance, mesmo que ela seja a décima quinta e que terceiros sejam atingidos pelos erros constantes do “agora exemplo”.

Os mais fervorosos hoje bons samaritanos são ex-alguma merda. Parece que se reabilitar é mais importante do que não cometer os erros. Ou até pior: parece ser mais notável se dar méritos a quem faz merda do que a quem faz boas escolhas.

Não estamos aqui falando de um garoto fodido sem oportunidade. Estamos falando de alguém que se acha inclusive intelectual ao ponto de ser símbolo de movimentos políticos. Portanto, ao contrário de muitos casos, não falamos de uma vítima.

E então vem matérias, documentários, entrevistas, glamour. Que do caralho! Ele entrou nas drogas, destruiu vidas, pessoas, causou acidentes, sustentou traficantes pra se divertir e eu devo tê-lo como algo positivo.

Ok, é interessante se você olhar pela perspectiva de quem vive o mesmo problema. Mas aos meus olhos? Aos da maioria?

Primeiro que na mesma semana em que dá palestras sobre como se recuperar mostra-se não tão bem assim. Constrangedor ir ao ar dormindo, claramente alterado. Seja por drogas lícitas, ilícitas, tanto faz. Não há qualquer cabimento entre usar alguém de exemplo de recuperação num dia e coloca-lo no ar para mostrar seu desequilibrio 3 dias depois.

Não vou entrar no mérito do comentarista. Nem da pessoa. Mas do exemplo em si.

Ao lado dele costuma estar um garoto de nenhum glamour, de vida impressionantemente correta, de habitos exemplares, educação impecável e alvo de cobiça das mais fofas sogras de todo país. Ao Caio, pouca exposição como “exemplo”. Ao Casão, toda.

Que valores são esses que o Brasil carrega hoje? Ou que a mídia tenta nos impor.

Porque junto da matéria que mostra um dos funcionários da casa lutando contra as drogas não há também uma mostrando a família do garotinho que o dinheiro dado por quem usa destruiu nas mãos do traficante na favela?

Quem é a vítima? Quem é o vilão e quem é o exemplo? Pra quem eu aponto quando for dizer aos  meus filhos o que é bom ou ruim?

Porque o Casagrande é um exemplo? Porque as pessoas morrem de medo de contestar essa postura da Globo quanto a isso?

Eu torço muito por ele. De verdade. Mas eu não acho que expor um sujeito a dormir na televisão ao vivo seja uma forma inteligente de mostrar nenhum tipo de recuperação e muito menos de glamourizar um vilão que, por sua escolha, se tornou “vítima”.

Vítima é quem toma um tiro com a arma que o traficante comprou com o dinheiro de quem usa. É a família de quem usa. A pessoa que tá no outro carro num acidente causado por um viciado. O garotinho que tem a favela tomada por um bandido que o força a ir pro caminho errado enquanto os playboys consomem a porra da droga.

O exemplo do que queremos está na Globo também. Mas sem mídia e glamour. Se chama Caio. Não Casagrande.

abs,
RicaPerrone