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Não ao preconceito

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Não ao preconceito

Aderi! Agora serei um Zé Ong chato pra caralho que defende as minorias e vive das migalhas da hipocrisia alheia!

Mentira, não nasci com vocação pra otário.  Mas, já que o assunto do século é esse, vamos leva-lo ao futebol?

“Pré-conceito” é fazer uma idéia antecipada daquilo que não se conhece. É quando você atravessa a rua porque vem um negão com cara feia, ou quando você não dá atenção a um menino que tem sotaque de nordestino, ou quando acha que todo “paulista ou carioca do eixo” é um babaca que te odeia.

No futebol há preconceito, como em todo lugar. Eu sou preconceituoso, você também é, o mundo é. Dizemos que não, mas dizemos o que precisamos dizer, não o que queremos. Afinal, se formos transparentes ou ousarmos pensar sozinhos e não com a minoria que berra, somos arrogantes, ignorantes e burros.

Damos mais valor ao jornalista que fala bonitinho, ao técnico de terno, a quem usa o microfone mais poderoso. Nem todo reporter da emissora do interior é um merda, como nem todo global é um puta profissional.

Com jeitinho padrão, carinha de sério e fingindo ser “professor”, temos 50% de um treinador. Aquele que vai a praia, usa palavrão, anda de óculos escuros e não faz a menor questão de “parecer” ideal, não tem o mesmo respeito.

Caio Jr. é bacana. Estuda, fala bonito, não acerta porra nenhuma, mas assim como o Parreira, é um papo de bom nível. Dane-se os resultados, as teses, o que for. Se bem colocada, se com carinha de intelectual, passa fácil.

Se o Parreira usasse bermuda, fosse de havaianas numa coletiva e falasse: “Tá foda” ao vivo, seria lembrado pelas mil passagens ridículas em grandes clubes que teve. Como é gentil, educado e PARECE diferenciado, é lembrado pelo Tetra, aquele que quase perdeu.

“Parecer ser” é muito mais importante neste mundinho hipocrita e covarde do que, de fato, ser.

Cai um treinador. Imediatamente me lembro de Renato Gaúcho.

O cara que fez com o Flu o mais brilhante momento do clube nos últimos 30 anos, talvez. Campeão da Copa do Brasil, duas vezes entre os primeiros do Brasileirão, finalista de Libertadores e que fez do Grêmio desacreditado um time na zona de Libertadores.

De 2007 pra cá, Renato mais acerta do que erra. Erra, como todos erram, mas acerta bastante. E quando erra multiplicam por 10. Quando acerta, minimizam.

Não porque o odeiam, mas porque tem vergonha de reconhecer que alguém de chinelo pode fazer mais e melhor do que alguns de terno.  É dificil não ser comum e seguir o padrão.  É um crime um jornalista não querer ir pra TV, como deve ser afrontoso um treinador não querer sair da praia mesmo com algumas ofertas.

A carreira de Renato é bastante promissora. Seus últimos anos foram bons, cheios de trabalhos notáveis. Bem mais do que Roth, Geninho, Falcão, Abel, Leão, entre tantos outros que tem o triplo de seu status no mercado.

O mundo, aquele mesmo que pede tolerância pra minorias que dão ibope, esquece de esconder todos os seus outros preconceitos.

Basta um chinelo, uma camisa aberta e um sorriso na cara segunda-feira as 15h para ser menos do que aquele que usa o terno. Basta tentar não seguir o sugerido pela maioria para ser considerado rebelde, polêmico, etc.

Renato é o que é. E é há 30 anos.  Outros tantos tentam ser o que vocês querem que eles sejam. E conseguem.

Preferimos quase sempre o modelinho padrão de comportamento ou idéias. Não toleramos qualquer alternativa, ou, sendo mais prático, qualquer simplicidade que se torne um espelho do fracasso alheio.

Renato, de chinelo, faz mais do que muitos de terno. E isso incomoda. Ali, na praia, gasta o que a enorme maioria de nós não chegará perto de ter. Ele tem, e tem do jeito dele.

“Poderia ter mais se mais comportado fosse”, dirá o intelectual de merda.

E quem disse que se comporta mal aquele que se comporta com verdade?

E não, não estou sugerindo Renato em clube algum, sequer tentando discutir sua qualidade como técnico. O foco é outro. Preste bem atenção.

Não acho Renato o melhor técnico do país. Longe disso.

Mas não me sinto confortável em saber que por “parecer fanfarrão” um sujeito não tem o direito de ser tão ou mais competente do que aquele quadradinho de terno e gravata que faz o que a cartilha manda, mesmo que seja de sua natureza.

O mesmo mundo que implora e quase obriga você a pensar que uma cor, orientação sexual, local de nascimento ou modo de falar não pode determinar valores, esquece de notar que a sua postura passa a ser tão intolerante quanto com aqueles que não seguem o novo padrão de “bom cidadão”.

Nunca ouvi nada sobre o Renato, por exemplo. Que ele é mulherengo? Foda-se! Aliás, parabéns! Que ele toma uma na praia? Que gosta de papo e futvolei? E aí?

O que faz dele menos competente, sério ou capaz do que aquele sujeito que passa o dia na frente da tv analisando mil teorias e não conseguindo colocar nenhuma delas em prática?

Porque o rótulo é tão importante pra fazer julgamentos? Isso não seria, também, “pré-conceito”?

Mais quantos Romários serão precisos para entendermos que ser “Kaká” não torna ninguém mais capaz, inteligente ou competente?

Mais Renatos, mais Romários, menos do mesmo.

abs,
RicaPerrone