Carta ao nosso treinador

Caro Adenor;

Meu nome é Ricardo eu tenho 37 anos e posso afirmar sem muita frescura que a coisa que mais amo na vida é futebol.

Me tornei jornalista e por consequência disso passei a torcer por pessoas, perdi boa dose da rivalidade que sustenta a paixão clubista e, embora ainda seja um tricolor que ama muito seu clube, guardei pra seleção todo meu lado passional para poder manter o fundamental “desequilíbrio” de um torcedor em minha vida.

Em 1986, Tite, eu fui até o quarto da minha mãe e perguntei pra ela como rezava. Ela me explicou que eu devia falar com papai do céu como falo com um amigo e pedir o que desejo, sem esquecer de agradecer pelo que tenho.

Pela primeira vez eu fui até meu quarto, deitei, juntei as mãos, fechei os olhos e disse: “Deus, aqui é o Ricardo. Faça o joelho do Zico ficar bom pra a gente ganhar a Copa. Amem”.

Foi a primeira vez que rezei na vida. Nunca fiz outra oração tão sincera quanto essa. Tinha 8 anos, nenhuma maldade, apenas a vontade de ver meu pai e eu felizes com a seleção campeã.

O tempo passou e eu voltei a falar com Deus. Não sou religioso, ao contrário de você, mas acredito que exista algo. No dia que a seleção perdeu pra Alemanha eu fui a Belo Horizonte de carro e voltei de avião, ainda no intervalo do jogo. Foi o pior dia da minha vida.

E quando eu deixei o estádio, ainda com a bola rolando, acredite, eu olhei aquele cenário devastador de crianças e brasileiros de cabeça baixa e voltei a falar com ele. “Porque, cara? Porque com a gente?”.

Ele nunca me respondeu, é claro. O coloquei em xeque na final. Quando acabou o tempo normal do jogo eu via a possibilidade da Argentina ser campeã em pleno Maracanã e fui até o muro da arquibancada que dá para a rua. Olhei pra cima e num momento de raiva, medo e total desespero, falei: “Se tu existe, não pode ser tão filho da puta. Eles não podem ganhar aqui”.

A Alemanha fez o gol e eu vou acreditar pra sempre que convenci Deus que não era justo o 7×1 mais o título argentino.

Porque eu to te contando tudo isso, Tite? Porque hoje eu estou tendo a alegria de ver gente nossa voltando a se colocar do nosso lado. Brasileiros dispostos a acreditar mais uma vez, como sempre deve ser.

E isso se deve muito a sua forma de conduzir, de chegar, de se apresentar e de nos mostrar, através de uma carreira, que ainda da pra confiar na meritocracia. Nunca um treinador mereceu tanto um cargo quanto você na seleção hoje.

Você não tem está dirigindo um time de futebol. Sua missão é comandar e resgatar o maior motivo de orgulho que este povo ostentou por décadas.

Talvez você perca a paciência cedo com as absurdas cobranças do cargo, mas hoje fala aqui aquele garotinho de 8 anos em sua cama olhando pro céu.

Boa sorte, Tite. E proteja-o, senhor.

abs,
RicaPerrone