900 dias no Rio

Ginga pra lá, bunda pra cá, aquela pele bronzeada, o jeitinho de falar. Cariocas são sedutores por natureza, e mais do que isso, por sobrevivência.

Aqui, não é uma questão de “dever”, mas sim de conquista. Do posto de gasolina ao chopp mais geladinho, há um jogo de sedução não necessariamente sexual. Mas em tudo, pra tudo, o tempo todo, o carioca sensualiza.

As mulheres do Rio de Janeiro exalam sensualidade. Das marquinha de biquini já inclusas no pacote básico ao espetacular dourado que mantém o ano todo. As roupas curtas usam o argumento do calor, mas me arrisco dizer que se nevasse no Rio as mini-saias continuariam.

Cariocas querem sempre ser invejados. Pelo corpo, pelo time, pelo bairro, pelo quanto bebe de cerveja. Pouco importa. É sempre uma disputa vaidosa pelo olhar alheio.

O curioso lugar onde o favelado não reclama, mas sim se defende dizendo ser ali o “melhor lugar pra se viver”. Não é. Mas ouse dizer que não.

Entre a pena e a inveja, nunca titubeiam. Querem sempre a segunda opção. E conquistam, seja por mérito, discurso bem feito ou uma marra as vezes incompreensível.

O pobre exalta a comunidade. O rico finge que não se importa com ela. Os dois frequentam os mesmos lugares e de sunga não podem dizer pro garçom quem atender primeiro. Então, sensualizam no chamado. Pelo nome, um apelido carinhoso, um sorriso malandro. Até que o garçom escolha qual chinelo de dedo vai atender primeiro.

Eu aprendi a amar o Rio de Janeiro quando o entendi. E pra entendê-lo você também precisa seduzir o povo local não tentando ser melhor do que eles, mas sim parte deles.

O carioca tem defeitos. Claro que tem! Folgado, marrento, desafia a lógica, o tempo, o chefe, até o bom senso as vezes. Mas sorri. E sorri com uma facilidade irritante.

A troca do “S” pelo “X” é uma determinação cultural pra que a mulher carioca gostosa se torne ainda mais gostosa quando abre a boca.

As vogais puxadas e os intermináveis “erres” também fazem parte de um cuidadoso esquema para seduzir você. Mesmo traídos pela vontade de economizar palavras, as vezes transformam em gíria. “Ax muliéreix do Riii” também podem ser “ÁrrMulé”.

“Ox bróderrr” podem ser “ÓrrMuleque”, e isso vai variando de acordo com a vontade de sensualizar.

Tem dia que o mar aqui fica como no Caribe. E nós, “visitantes”, ficamos espantados. E eles também! Mas não podem demonstrar. Numa risadinha marota de canto de boca fingem achar tudo aquilo natural.

Natural é o caralho! Onde que é normal o mar mudar de cor, cacete?

“No Riiii, irrrrmão”.

Eu vou ficando. Cada dia mais assustado com a violência, cada dia mais otimista com tantas e tantas obras. O Rio jamais será a cidade modelo. Até porque modelo é algo que se copia. Não haverá outro Rio de Janeiro no mundo por mera falta de matéria prima.

O cartão postal tem um símbolo religioso entre mares e montanhas, o garoto propaganda é um gari que samba. Pode tentar, rodar o mundo, ir a cada cidadezinha que existir.

Não há nada parecido.

abs,
RicaPerrone

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