Parabéns, Raí!

Serei egoísta. A idéia era fazer um texto sobre o Raí e tentar passar a importância dele para o SPFC, enfim, aquilo que todos já sabem. Não consegui fazer. Saiu algo redundante e cheio de frases feitas, o que é pouco para este cidadão que recebe esta homenagem. Resolvi então fazer o simples. Vou falar de mim mesmo, e através disso, tenho absoluta certeza, outros milhares assinarão embaixo.       

Eu nasci tricolor, cresci tricolor e vou morrer tricolor. Eu gritei o nome do Careca, tive em Oscar e Dario meus primeiros ídolos que não faziam gols e em Zetti e Gilmar os que os evitavam. Ousei ser fã de Bernardão, que era grosso, mas que dava o sangue pela camisa que eu amava. Chorei naquele Morumbi em 1989, quando pela primeira vez entendi e senti o que é perder. Antes disso, tudo era festa, eu era moleque, nem entendia direito. Ali nascia um fanático, pois o que eu senti quando Sorato fez aquele gol não era mais uma brincadeira de criança. 

Recebi liberação dos meus pais pra ir aos jogos sozinho em 1991, mas antes disso, sem que eles soubessem, eu já fazia. Morava perto, inventava trabalho de escola e ia ver o Tricolor. As vezes meu pai ia na cativa e eu na arquibancada, ele nem imaginava. Achava que eu estava no clube jogando bola. Eu tinha 12 anos, mas aquilo já era minha paixão. 

Comecei a notar que um cidadão alto, forte, de postura elegante crescia no meu time e vestia a camisa 10. Raí, que a torcida ainda se limitava apenas a aplaudir como qualquer outro. Fez 3 no Corinthians numa final onde eu assistia da geral, entre corintianos, pois foi o ingresso que sobrou. Eu pulava no meio deles e, sem a menor noção do perigo, cantava o hino do SPFC e tirava sarro. Nunca me esqueço, foi o maior perigo de vida que já sofri na vida. 

Vieram os títulos, a Libertadores, os mundiais, enfim… o festival de atuações de gala. Eu estava lá no dia que ele fez 5 no Noroeste e ainda deu o pênalti pro Muller bater. Nossa, como eu comemorei. Quando ele fez do meio da rua, do estádio eu achei que tivesse sido do meio-campo. Ajoelhei e comemorava como se tivesse visto o gol do Pelé ao vivo. Depois, na Tv, vi que não era bem assim. Mas que se dane, quem é Pelé perto de Raí pra um tricolor? 

Passada a Libertadores de 93, ele se foi. Eu, com meus 14 ou 15 anos, chorei na frente da Tv vendo ele aparecer no aeroporto. Eu não me conformava, tinha umas 10 camisas dele no armário. Ele era um ídolo igual o Senna na época pra mim. Eu comemorava meus raros gols na rua dando aquele soco trocado no ar, enfim… ele era o ídolo de um garoto que hoje escreve aqui na no blog. 

Ele se foi, e claro que eu comprei a camisa do PSG e me tornei torcedor do time. Não dava pra acreditar, mas o SP vencia sem o Raí. Mas, antes disso, teve a despedida. Um jogo contra o Santos, 6×1, onde ele jogou uma barbaridade, só pra variar. Eu fui, e com dor no coração, aplaudi sua saída e aos berros cantei “Raí, Raí, o terror do morumbi”, pela última vez. Deu dor de cabeça de tanto que eu gritei, parecia que eu queria que ele ouvisse. Coisa de moleque, mas faz parte da vida. 

Eu cresci, e um dia, saindo dos vestiários do Morumbi, já estagiando no meio, dei de cara com ele recebendo um CD de um companheiro do time rival na escada. Era em 1998, acho. Eu tinha a chance de fazer uma pergunta e voltar pra Band com ela gravada, de mostrar serviço. Mas não… eu parei, olhei, e fiquei olhando até ele se levantar, passar por mim, apertar minha mão sem que eu pedisse e dizer: “Tudo bem?”. Eu só tive a reação de dizer: “Caralho… você é meu ídolo!”. Ele riu, me deu um abraço e foi embora deixando um autografo. Jornalista de merda, nem pra aproveitar e fazer uma pergunta Mas, eu admito, sou péssimo jornalista quando o SPFC está envolvido. Sempre fui, acho que sempre serei.


Mas, antes deste encontro, eu tive ainda outro prazer e risco de vida por causa dele. Ele voltou pra final em 98, e era contra o Corinthians do Luxemburgo, que havia vencido o primeiro jogo. Meu pai dizia no caminho: “Esse negócio de colocar jogador na final não dá certo…”, e eu dizia: “ Mas é o Raí, pai…”. Cheguei e sentei na geral novamente, pois foi o que restou. O povo foi chegando e notei que ao meu lado existiam 5% de tricolores e 95% de corintianos. Era dia das mães, e ele entrou em campo com o time, para minha alegria.         

Fez o primeiro gol, deu passe pro segundo, jogou uma barbaridade, e fomos campeões. Não esqueço, nem a pau. Minha tia estava pela primeira vez comigo no estádio. Ela olhava pra mim e dizia pro meu pai: “Ele vai ter um troço!!!”. E eu gritava com a torcida, absolutamente alucinado com o que eu via. Do meu lado, corintianos já xingavam, mas meu estado de felicidade era tamanho que eu chegava e puxar alguns deles e gritar bem perto: “Arere… corinthians veio aqui pra se foder!!!”. O Morumbi tremia, meu pai idem, e eu ali cantando faltando 10 minutos pra acabar o jogo. Foi do cacete aquele dia. Rei é rei, e o palácio é dele. Aqui ninguém manda mais do que ele. Pode chegar, pegar a camisa e jogar quando quiser, a casa é sua e a nação segue o que você pedir. 

Depois, curiosamente no dia dos pais, ele se machucou. Voltou, jogou bem, e depois parou. Parou e não teve a despedida, o que até hoje, confesso, me causa revolta e muita vontade de esmurrar a diretoria que recusou na época. Isso não se faz, e no meu entender foi o maior absurdo cometido pela diretoria do SPFC até hoje. Deixar Raí se despedir na França é um afronto a tudo que ele fez, ao clube, a torcida e, particularmente, a minha história. Eu me recuso a acreditar nisso até hoje, e tenho vontade de esganar o responsável pelo “não” toda vez que me lembro. 

Um dia, em 6 de outubro de 2006, eu olhei pra ET pronta pra ir pro ar e disse pro Daniel: “Meu sonho era que o Raí fosse padrinho do site, ele é meu maior ídolo no clube”. Ele disse: “Meu também”. Liguei pro Murro e pro Nei e foi unânime: “Liga e convida, ele é nosso maior ídolo!”. Liguei, o assessor dele se matou pra conseguir que eu falasse com ele até que, no aeroporto, na sala de embarque, ele atendeu. 

Fora do ar, me apresentei e ele, talvez por educação, talvez por acompanhar o SP pela internet, disse saber quem eu era. Pedi a ele que fosse o padrinho do projeto que nascia naquele dia e ele, todo sem jeito, disse: 
– Mas eu to no aeroporto. Eu queria, fico muito honrado, mas o que eu preciso fazer?
– Nada, Raí. Só aceitar…
– Claro que eu aceito! Uma honra! Muito obrigado!
– Posso gravar com você confirmando isso por 5 minutos?
– Por favor, claro que pode. 

E aí ele falou na rádio de abertura da ET. Terminou, e eu desliguei o telefone bastante alterado. Eu estava emocionado, era óbvio. Num dia eu grito na arquibancada, no outro o meu maior ídolo é padrinho de um projeto que faço parte? Quem não ficaria? 

Ano passado, pela ET, tive a honra de ligar pra ele e dar parabens pessoalmente, no ar! Esse ano não tenho a ET, logo, não tenho motivos pra ligar…

Eu tenho até alguma dificuldade pra ser fã de alguém como fui e sou até hoje de Senna, Tyson, Schumacher, Zico, Raí e Romário. Foram ídolos tão fortes que os que tenho hoje não conseguem se igualar ao nível destes pra mim. 

Raí foi o melhor e mais importante jogador que eu vi colocar a camisa do meu clube. Me perdoem os fãs do Ceni, eu também sou um deles, mas na minha opinião a importância do Raí é incomparável em virtude do que era o SPFC e do que passou a ser através dele. Lamentavelmente a garotada não viu jogar tão de perto, e não fazem idéia do que perderam. Mais lamentável ainda é o SPFC ter se negado a lhe dar uma despedida, e essa é uma magoa que eu vou ter com o clube pro resto da minha vida, como acredito que muitos torcedores tem. Deve estar cheio de garoto de 17, 18 anos que não está entendendo nada do que eu estou dizendo. Mas aposto o que for que está cheio de gente com 30 que está assinando embaixo cada parágrafo. Só quem viveu essa fase sabe do que eu estou falando… 

Hoje, Raí completa 44 anos. Não tenho nada pra dizer além de muito obrigado. Pelo ídolo, pela pessoa, pelo apadrinhamento, pelos gols, pela postura, pela educação e por ter me dado a chance de crescer me espelhando e tentando imitar um ídolo de caráter, postura e valores. Você é o Rei do Morumbi, e ninguém vai tirar isso de você, mesmo que um dia apareçam outros tão importantes quanto. 

Quando eu tiver um filho eu vou torcer para que ele tenha um ídolo como eu tive. Que ele procure imitar quando garoto alguém que tenha as suas características e atitudes. 

Feliz aniversário, meu ídolo!

Abs,
RicaPerrone